quarta-feira, 4 de maio de 2016

Ladainha do Imaculado Coração de Maria


Ladainha do Imaculado Coração de Maria
NOSSA SENHORA FATIMA_1....jpg


Senhor, tende piedade de nós
Cristo, tende piedade de nós.
Senhor, tende piedade de nós.
Jesus Cristo, ouvi-nos.
Jesus Cristo, atendei-nos.
Deus, Pai dos Céus, * tende piedade de nós.
Deus Filho, Redentor do mundo, *
Deus Espírito Santo, *
Santíssima Trindade, que sois um só Deus, *

Coração de Maria, concebido sem pecado, rogai por nós.
Coração de Maria, cheio de graça,
Coração de Maria, bendito entre todos os corações,
Coração de Maria, sacrário da Santíssima Trindade,
Coração de Maria, semelhantíssimo ao Coração de Jesus,
Coração de Maria, no qual Jesus bem se compraz,
Coração de Maria, abismo de humildade,
Coração de Maria, trono de misericórdia,
Coração de Maria, incêndio de amor divino,
Coração de Maria, oceano de bondade,
Coração de Maria, prodígio de pureza e de inocência,
Coração de Maria, espelho de todas as perfeições divinas,
Coração de Maria, no qual o Sangue de Jesus, preço de nossa redenção, foi formado,
Coração de Maria, que apressastes por vossos desejos a salvação do mundo,
Coração de Maria, que obtendes graças para os pecadores,
Coração de Maria, que conservais fidelissimamente as palavras e as ações de Jesus,
Coração de Maria, transpassado por um gládio de dor,
Coração de Maria, acabrunhado de aflição durante a Paixão de Jesus Cristo,
Coração de Maria, pregado à Cruz com Jesus crucificado,
Coração de Maria, sepultado pela dor com Jesus morto,
Coração de Maria, restituído à alegria pela Ressurreição de Jesus,
Coração de Maria, inundado de inefável consolação na Ascensão de Jesus,
Coração de Maria, cumulado de uma nova plenitude de graças na descida do Espírito Santo,
Coração de Maria, consolação dos aflitos,
Coração de Maria, refúgio dos pecadores,
Coração de Maria, esperança e doce sustentáculo daqueles que Vos veneram,
Coração de Maria, socorro dos agonizantes,
Coração de Maria, alegria dos Anjos e dos Santos,

Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do mundo,

R/. perdoai-nos, Senhor.
Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do mundo,

R/. atendei-nos, Senhor.
Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do mundo,

R/. tende piedade de nós.
V/. Maria Imaculada, mansa e humilde de coração,

R/. fazei meu coração semelhante ao Coração de Jesus.
Oremos. Deus clementíssimo que, para salvação dos pecadores e alívio dos desvalidos, quisestes que o Imaculado Coração da Bem-Aventurada Virgem Maria fosse idêntico em caridade e misericórdia ao Divino Coração de seu Filho Jesus Cristo, concedei-nos, a nós que celebramos esse dulcíssimo e amantíssimo Coração, a graça de  pelos méritos e intercessão da mesma Bem-aventurada Virgem - nos tornarmos conformes ao Coração de Jesus. Por Cristo Nosso Senhor. Amém.



História da Devoção ao Imaculado Coração de Maria


IMACULADO CORAÇÃO DE MARIA !












Liturgicamente a Festa do Imaculado Coração de Maria (1) deve ser celebrada no Sábado a seguir ao Segundo Domingo de Pentecostes..


A devoção ao Imaculado Coração de Maria não é nova na Igreja porque tem as suas raízes mais profundas no Evangelho que muitas vezes faz referências ao Coração da Mãe de Deus.


- Quanto a Maria, conservava todas estas coisas, ponderando-as no seu Coração. (Lucas 2, 19).


- Depois desceu com eles, voltou para Nazaré e era-lhes submisso. Sua Mãe guardava todas estas coisas no seu Coração. (Lc 2, 51).



Os Santos Padres os místicos da Idade Média, os Teólogos e os Ascetas dos séculos seguintes, foram todos grandes devotos do Coração de Maria, como do Coração de Jesus. 
Mas foi sobretudo S. João Eudes (1601-168O), o grande promotor do culto litúrgico que se devia tornar em devoção e patrimônio comum dos fiéis, o qual "movido do grande amor que o inflamava, para com os Corações de Jesus e Maria, foi o primeiro que, não sem divina inspiração, pensou em tributar-lhes culto litúrgico. Da qual dulcíssima devoção deve considerar-se pai ... doutor.. e apóstolo”.
O Santo, já em 1643, vinte anos antes de celebrar a festa do Coração de Jesus, celebrava com os seus religiosos a do Coração de Maria.
Esta festa tornou-se pública em 1648, entrando assim na liturgia comum, e a partir daí, muitos bispos autorizaram nas próprias dioceses o o culto do Coração de Maria.
Os dois atos mais importantes da Santa Sé em favor do Imaculado Coração de Maria foram :
* A disposição de Pio VII (1805), que a festa se pudesse conceder às Dioceses e Institutos Religiosos que a pedissem.
* A Missa e Ofício próprios aprovados por Pio IX (1855), mas unicamente pro aliquibus locis (para algumas localidades).
Foi sobretudo a partir das Aparições de Fátima que se divulgou por todo o mundo a devoção ao Imaculado Coração de Maria, pois, como escreveu o Cardeal Cerejeira "a missão especial de Fátima é a difusão no mundo do culto ao Imaculado Coração de Maria. À medida que a perspetiva do tempo nos permitir julgar melhor os acontecimentos de que fomos testemunhas, estou certo que melhor se verá que Fátima será, para o culto do Coração de Maria, o que Paray-le-Monial foi para o Coração o de Jesus". (8-9-1946).
Os desígnios misericordiosos de Deus começam a manifestar-se nas Aparições de Junho e sobretudo de Julho de 1917, na Cova da Iria e tiveram o seu magnífico Epílogo em Espanha, nas visões de 1925 e 1926 em Pontevedra, e em 1927 e 1929 em Tuy.
Em Fátima, no dia 13 de Junho manifesta-se o Coração de Maria circundado de espinhos, pedindo reparação, enquanto a Senhora pronuncia estas palavras "Jesus quer estabelecer no mundo a devoção ao meu Imaculado Coração".
Na Aparição de Julho, os destinos do mundo e das almas aparecem dependentes do Coração Imaculado de Maria, segundo o que foi revelado na visão do Inferno :
- «Vistes o Inferno, para onde vão as almas dos pobres pecadores.
Para as salvar, Deus quer estabelecer no mundo a devoção ao meu Imaculado Coração.
Se fizerem o que Eu vos disser, salvar-se-ão muitas almas e terão a paz.
A guerra vai acabar, mas, se não deixarem de ofender a Deus, no reinado de Pio XI começará outra pior.
Quando virdes uma noite alumiada por uma luz desconhecida, sabei que é o grande sinal que Deus vos dá de que vai punir o mundo de seus crimes por meio da guerra, da fome e de perseguições à Igreja e ao Santo Padre.
Para a impedir, virei pedir a consagração da Rússia ao meu Imaculado Coração e a Comunhão reparadora nos primeiros sábados.
Se atenderem a meus pedidos, a Rússia converter-se-á e terão paz. Se não, espalhará os seus erros pelo mundo promovendo guerras e perseguições à igreja; os bons serão martirizados; o Santo Padre terá muito que sofrer; várias nações serão aniquiladas.
Por fim, o meu Coração Imaculado triunfará.
O Santo Padre consagrar-me-á a Rússia que se converterá e será concedido ao mundo algum tempo de paz.
Em Portugal se conservará sempre o Dogma da fé; etc....»(Doc.341).
A 13 de Junho de 1929, na capela do Convento das religiosas Doroteias, em Tuy, numa Hora-Santa das 11 à meia-noite, cumpriu-se a promessa feita por Nossa Senhora no dia13 de Julho em Fátima : "Virei pedir a Consagração da Rússia ao meu Imaculado Coração".
Lúcia descreve essa Aparição :
- «Estando uma noite só, ajoelhei-me entre a balaustrada no meio da capela a rezar, prostrada, as orações do Anjo.
Sentindo-me cansada, ergui-me e continuei a rezá-las com os braços em cruz.
A única luz era a da lâmpada.
De repente iluminou-se toda a capela com uma luz sobrenatural e sobre o altar apareceu uma Cruz de luz que chegava até ao tecto.
Em uma luz mais clara via-se na parte superior da cruz uma face de homem com corpo até à cinta, sobre o peito uma pomba também de luz, e pregado na cruz o corpo de outro homem. Um pouco abaixo da cinta, suspenso no ar, via-se um cálix e uma hóstia grande, sobre a qual caíam algumas gotas de sangue que corriam pelas faces do Crucificado e duma ferida no peito. Escorregando pela Hóstia essas gotas caíam dentro do cálix.
Sob o braço direito da cruz estava Nossa Senhora (era Nossa Senhora de Fátima e Seu Imaculado Coração...na mão esquerda...sem espada nem rosas, mas com uma coroa de espinhos e chamas), com o Seu Imaculado Coração na mão...
Sob o braço esquerdo, umas letras grandes, como se fossem de água cristalina que corresse para cima do Altar, formavam estas palavras :
GRAÇA E MISERICÓRDIA
Compreendi que me era mostrado o Mistério da Santíssima Trindade, e recebi luzes sobre este Mistério que não me é permitido revelar».
Depois Nossa Senhora disse-me :
"É chegado o momento em que Deus pede para o Santo Padre fazer, em união com todos os Bispos do Mundo, a consagração da Rússia ao Meu Imaculado Coração, prometendo salvá-la por este meio”.(Doc.463).
Sobre a Aparição de 10 de Dezembro em Pontevedra, escreveu a irmã Lúcia :
- «Dia 10-12-1925, apareceu-lhe a SSma Virgem e, ao lado, suspenso em uma nuvem luminosa, um Menino.
A SSma Virgem, pondo-lhe no ombro a mão, mostrou-lhe ao mesmo tempo um Coração que tinha na outra mão, cercado de espinhos.
Ao mesmo tempo, disse o Menino : "Tem pena do Coração da tua SSma Mãe, que está coberto de espinhos, que os homens ingratos a todos os momentos Lhe cravam, sem haver quem faça um ato de reparação para os tirar" 
Em seguida, disse a SSma Virgem :
"Olha, Minha filha, o Meu Coração cercado de espinhos, que os homens ingratos a todos o momentos me cravam, com blasfémias e ingratidões.
Tu, ao menos, empenha-te em Me consolar e diz que todos aqueles que durante 5 meses, no primeiro sábado, se confessarem, receberem a Sagrada Comunhão, rezarem um Terço, e Me fizerem 15 minutos de companhia, meditando nos 15 mistérios do Rosário, com o fim de Me desagravar, Eu prometo assistir-lhes na hora da morte com todas as graças necessárias para a salvação dessas almas". (Doc. 401).
Cumpriu-se o que Nossa Senhora tinha dito na Aparição de 13 de Julho em Fátima :"Virei pedir a devoção reparadora dos primeiros Sábados".
Foi este o grande pedido de Reparação ligada ao Imaculado Coração de Maria e à Mensagem de Fátima, pelo que o Dr. Formigão Sob o pseudônimo de Mira Ceti, escrevia na revista Stella em 23 de Outubro de 1939 :
- «A humanidade debate-se atualmente numa das crises mais graves e mais angustiosas da sua história muitas vezes milenar.
Os pecados dos indivíduos e dos povos clamam vingança ao Céu. Grandes e terríveis provações de toda a ordem impendem sobre o mundo e ameaçam talvez Portugal.
Que todos quantos veneram e amam a Virgem Santíssima se apressem a praticar, renovando-a muitas vezes, a devoção dos cinco sábados que Ela se dignou revelar à Irmã Maria Lúcia de Jesus, a humilde vidente de Fátima, e assim porventura a paz tão suspirada descerá sobre as nações e a graça de Deus iluminará e vivificará as almas - tão grande número de almas nas sombras do erro e da morte.(Pag.260).
Em 4 de Maio de 1944 o Papa Pio XII ordenou que esta festa fosse observada em toda a Igreja para obter a intercessão de Maria para :
* A Paz entre as Nações.
* A liberdade para a Igreja.
* A conversão dos pecadores.
* O amor pela pureza e a prática da virtude.

A Consagração do Mundo ao Imaculado Coração de Maria pelo Papa Pio XII (2) veio complementar a Consagração do Mundo ao Sagrado Coração de Jesus feita pelo Papa Leão XXIII (3).



Dos Sermões de São Lourenço Justiniano, bispo
(Sermo 8, in festo Purificationis B.M.V.: Opera 2, Venetis1751,38-39)

Maria conservava tudo em seu coração
            Maria refletia consigo mesma em tudo quanto tinha conhecido, através do que lia, escutava e via; assim, progredia de modo admirável na fé, na sabedoria e em méritos, e sua alma se inflamava cada vez mais com o fogo da caridade! O conhecimento sempre mais profundo dos mistérios celestes a enchia de alegria, fazia-lhe sentir a fecundidade do Espírito, a atraía para Deus e a confirmava na sua humildade. Tais são os efeitos da graça divina: eleva do mais humilde ao mais excelso e vai transformando a alma de claridade em claridade.
            Feliz o coração da Virgem que, pela luz do Espírito que nela habitava, sempre e em tudo obedecia à vontade do Verbo de Deus. Não se deixava guiar pelo seu próprio sentimento ou inclinação, mas realizava, na sua atitude exterior, as insinuações internas da sabedoria inspiradas na fé. De fato, convinha que a Sabedoria de Deus, ao edificar a Igreja para ser o templo de sua morada, apresentasse Maria Santíssima como modelo de cumprimento da lei, de purificação da alma, de verdadeira humildade e de sacrifício espiritual.
            Imita-a tu, ó alma fiel! Se queres purificar-te espiritualmente e conseguir tirar as manchas do pecado, entra no templo do teu coração. Aí Deus olha mais para a intenção do que para a exterioridade de tudo quanto fazemos. Por isso, quer elevemos nosso espírito à contemplação, a fim de repousarmos em Deus, quer nos exercitemos na prática das virtudes para sermos úteis ao próximo com as nossas boas obras, façamos uma ou outra coisa de maneira que só a caridade de Cristo nos impulsione. É este o sacrifício perfeito da purificação espiritual, que não se oferece em templo feito por mão humana, mas no templo do coração onde Cristo Senhor entra com alegria.

Responsório

R. Virgem santa e imaculada, eu não sei com que louvores
poderei engrandecer-vos.
* Pois aquele a quem os céus não puderam abranger,
repousou em vosso seio.
V. Sois bendita entre as mulheres e bendito é o fruto,
que nasceu de vosso ventre.
Pois aquele a quem os céus nçao puderam abranger,
repousou em vosso seio.





Niterói, 4 de junho de 2016


Notas:

1 - Texto extraído do site Universo Católico

Carta a um devoto do Coração Imaculado de Maria

Carta a um devoto do Coração Imaculado de Maria





Estimado senhor: acabo de receber sua estimadíssima carta, com que me pede que diga alguma coisa para crescer cada dia mais e mais na devoção do Imaculado Coração de Maria. Querido amigo, não podia pedir-me coisa melhor, do que mais gosto. Eu gostaria que todos os cristãos tivessem fome e sede desta devoção. Ame, amigo meu, ame e ame muitíssimo a Maria (1).

E para que possa aumentar em pontos a sua devoção e satisfazer seus desejos, lhe direi que devemos amar Maria Santíssima: primeiro, porque Deus o quer. Em segundo lugar, porque ela o merece. E em terceiro, porque nós precisamos, por ser ela um poderosíssimo meio para obter todas as graças corporais e espirituais e finalmente, a salvação eterna (2).

1. Deus o quer

Devemos amar Maria Santíssima porque Deus o quer. Amar é querer bem ao amado, é fazer-lhe bem, é fazer-lhe participante de seus bens (3), pois o mesmo Deus nos dá exemplo e nos excita a amar Maria. O eterno Pai a escolheu por Filha sua muito amada; o Filho eterno a tomou por Mãe e o Espírito Santo, por Esposa; toda a Santíssima Trindade a coroou como Rainha e Imperatriz dos céus e terra e a constituiu dispensadora de todas as graças (4).

Você deve saber, amigo meu, que Maria Santíssima é obra de Deus e é a mais perfeita que saiu de suas mãos depois da humanidade de Jesus Cristo; nela brilham de um modo particular (5) a onipotência, a sabedoria e a bondade do mesmo Deus.

É próprio de Deus dar as graças necessárias a cada criatura, segundo a finalidade a que a destina (6) e como Deus destinou Maria para ser a mãe, filha e esposa do mesmo Deus e mãe do homem, daqui se imagina que tipo de coração lhe daria e com que graças a adornaria (7).

2. Ela o merece

Devemos amar Maria Santíssima porque ela o merece. Maria Santíssima o merece pelo acúmulo de graças que recebeu sobre a terra, pela eminência da glória que possui no céu, pela dignidade quase infinita da Mãe de Deus a que tem sido sublimada e pelas prerrogativas próprias desta sublime dignidade.

Maria foi como o centro de todas as graças e belezas que Deus tinha distribuído aos anjos, aos santos e a todas as criaturas (8). Maria tinha que ser Rainha e Senhora dos anjos e dos santos e, por isto mesmo, devia ter mais graças que todos eles, já no primeiro instante do seu ser. Maria tinha de ser a Mãe do mesmo Deus. É um princípio de filosofia que entre a forma e as disposições da matéria deve existir certa proporção (9); a dignidade de Mãe de Deus é aqui como a forma e o coração de Maria é a matéria que deve receber esta forma. Oh! Que acúmulo de graças, virtudes e outras disposições se agrupam naquele santíssimo e puríssimo coração!

Desde que Deus determinou fazer-se homem, fixou a vista em Maria Santíssima e desde então dispôs todos os preparativos necessários, a fez nascer dos patriarcas, profetas, sacerdotes e reis (10), e todas as graças destes reuniu em Maria e quis que Maria fosse a nata e a flor de todos eles. Ainda, a preparou com bênçãos de doçura e colocou sobre sua cabeça uma coroa de pedras preciosas (11), isto é, graças e belezas; mas muito mais enriqueceu seu coração.

No Coração de Maria devem ser consideradas duas coisas: o coração material e o coração formal, que é o amor e vontade (12).

O coração material de Maria é o órgão, sentido ou instrumento do amor e vontade (13); assim como pelos olhos vemos, pelos ouvidos ouvimos, pelo nariz cheiramos e pela boca falamos, assim pelo coração amamos e queremos (14).

Dizem os teólogos que as relíquias dos santos merecem veneração e culto: porque foram membros vivos de Jesus Cristo. porque foram templos do Espírito Santo. porque foram órgãos da virtude. porque serão instrumentos da graça e de milagres. 5º porque eles serão glorificados depois da ressurreição (15).

O coração de Maria reúne estas propriedades e muitas outras:

O coração de Maria não só foi membro vivo de Jesus Cristo pela fé e pela caridade, mas também origem, manancial de onde se tomou a humanidade (16).

O coração de Maria foi templo do Espírito Santo e mais que templo, pois do preciosíssimo sangue saído deste imaculado (17) coração o Espírito Santo formou a humanidade santíssima nas puríssimas e virginais entranhas de Maria no grande mistério da encarnação (18).

O coração de Maria foi o órgão de todas as virtudes em grau heróico e singularmente na caridade para com Deus e para com os homens (19).

O coração de Maria é um coração vivo, animado e sublimado no mais alto da glória.

O coração de Maria é o trono de onde se dispensam todas as graças e misericórdias.

Maria é verdadeiramente Mãe de Deus. Do mesmo modo como uma mulher, que deu à luz um homem, é chamada e é mãe daquele homem, assim também Maria Santíssima é e se chama, com toda propriedade, Mãe de Deus, porque o concebeu e o deu à luz; a mulher que deu à luz o homem se chama e é mãe daquele homem, que é um composto de alma e corpo e embora a alma venha somente de Deus, assim também Maria Santíssima é Mãe de Deus, porque este divino composto de pessoa divina, alma racional e corpo natural é o termo da geração nas puríssimas e virginais entranhas de Maria (20). Esta dignidade de Mãe de Deus é a que mais a enaltece, porque é uma dignidade quase infinita, porque é mãe de um ser infinito (21); é mais de quanto possui em graça e em glória. Os Doutores e Santos Padres dizem que pelos frutos se conhece a árvore, segundo consta no Evangelho; pois, que diremos de Maria, que deu à luz aquele bendito Fruto que tanto elogiou Isabel (22) quando disse: “Bendito o fruto do teu ventre! De onde me vem tanta honra, que a mãe do meu Senhor venha a mim?” (23).

Diz Santo Tomás que o fogo não pega na lenha até que esta tenha os mesmos graus de calor que aquele (24); pois bem, se para que do sangue do coração de Maria se formasse a humanidade à qual se devia juntar a divindade era preciso que tivesse uma disposição quase divina, que diremos agora de Maria se, além de ser considerada Mãe de Deus, juntamos as demais graças que depois recebeu de Jesus? (25). Jesus por onde passava fazia o bem a todos (26), mais ou menos segundo a disposição com que os encontrava; que pensaremos das graças e benefícios que dispensaria a Maria, em quem passou não rapidamente, mas que esteve em suas entranhas por nove meses e a seu lado por trinta e três anos, e achando-se sempre com as melhores disposições e preparação para receber os benefícios de Jesus? A estas graças devem juntar-se também as que recebeu do Espírito Santo no dia de Pentecostes e, além disso, devem ser acrescentadas as que ela conseguiu com o exercício de tantas e tão heróicas virtudes em todo o decurso da sua santíssima e longa vida, acompanhada daquela contínua e fervorosa meditação (27) em que, segundo o profeta, se acende a chama do divino amor (28). Ao considerar São Boaventura a graça de Maria, exclama dizendo: “A graça de Maria é uma graça imensa, múltipla”: Gratia Mariae, gratia est immensissima, gratia multiplicissima (29).

Não só devem ser consideradas as graças que Maria obteve para ser e por ter sido Mãe de Deus e as graças que recebeu de Jesus Cristo, do Espírito Santo e ela conseguiu com sua cooperação, mas também é indispensável fixar a atenção na multidão de incomparáveis prerrogativas que tão grande dignidade lhe tem dirigido. Faremos referência a algumas:

De ter sido preservada do pecado original, ao qual estaria sujeita se não tivesse sido destinada para ser Mãe do mesmo Deus; para isto, Deus a dotou de um coração imaculado, puríssimo, castíssimo, humilíssimo, mansíssimo, santíssimo, pois do sangue saído deste coração formou o corpo do Deus feito homem.

De ter concebido e dado à luz no tempo aquele mesmo Filho de Deus que o eterno Pai havia gerado na eternidade (30). Não duvide, diz São Boaventura, o eterno Pai e a Virgem sagrada tiveram um mesmo e único filho (31).

Assim como o eterno Pai teve este divino Filho sem perder nada da sua divindade, assim também a santíssima Virgem Maria concebeu e deu à luz este mesmíssimo Filho sem o menor detrimento da sua santíssima virgindade.

De ter tido um legítimo poder para mandar no Senhor absoluto de todas as criaturas, pois este é um direito que a natureza dá a todas as mães; direito ao qual quis sujeitar-se com gosto, pois disse que tinha vindo não para derrogar a lei, mas para cumpri-la com mais perfeição que os demais homens (32); e o evangelista São Lucas nos dá testemunho de como obedecia a sua Mãe e a São José: Et erat subditus eis (33). Mas este direito é uma honra a Maria Santíssima, que São Bernardo diz que não sabe o que é mais digno de admiração, se Jesus obedecer a Maria ou Maria mandar em Jesus; porque, diz o Santo, que Deus obedeça a uma mulher é uma humildade única e que uma mulher mande em um Deus é uma elevação sem igual (34).

Ter sido a esposa do Espírito Santo de uma maneira infinitamente mais nobre que outras virgens, pois, as outras somente merecem ser aliadas a este divino esposo quanto à alma, enquanto que Maria tem sido não só quanto à alma, mas também quanto ao corpo, embora da maneira mais casta. A aliança que existiu entre o Espírito Santo e as virgens castas só tem servido para a produção dos atos de virtudes, mas a aliança entre este divino Espírito e Maria Santíssima tem produzido de uma maneira inefável o Senhor das virtudes, Cristo Senhor Nosso.

Tem sido como o termo, por assim dizer, e a coroação da Santíssima Trindade: Maria universum sanctae Trinitatis complementum (35), porque produziu o mais excelente fruto da sua fecundidade ad extra, como dizem os teólogos; quer dizer, produziu um Deus homem. Maria produziu um sujeito capaz de dar à Santíssima Trindade uma honra tal como a Santíssima Trindade merece; honra que todas as criaturas juntas, e mesmo estas se multiplicando muitíssimas vezes, não eram capazes de pagar como o faz o Filho de Maria, Deus e homem verdadeiro.

Em ter sido feita Rainha e Senhora de todas as criaturas por ter concebido e dado à luz o Verbo divino, por quem foram feitas todas as coisas, como diz São João (36).

3. Eficácia desta devoção

Devemos amar Maria e ser seus verdadeiros devotos porque a devoção a Maria Santíssima é um meio poderosíssimo para alcançar a salvação. É a razão pela qual Maria pode salvar seus verdadeiros devotos, porque quer e porque o faz (37). Maria pode, porque é a porta do céu; Maria quer, porque é a mãe de misericórdia (38); Maria o faz, porque ela é a que obtém a graça justificante aos pecadores, o fervor aos justos e a perseverança aos fervorosos (39); por isto, os Santos Padres a chamam de resgatadora dos cativos, o canal da graça e a dispensadora das misericórdias (40). Por isto se disse que o ser devoto de Maria é um sinal de predestinação, assim como é uma marca de reprovação o não ser devoto ou adversário de Maria (41).

A razão é muito clara. Ninguém pode salvar-se sem o auxílio da graça que vem de Jesus, como cabeça que é da Igreja ou corpo, e Maria é (42) como o pescoço que junta, por assim dizer, o corpo com a cabeça; e assim como o influxo da cabeça no corpo deve passar pelo pescoço, assim, pois, as graças de Jesus passam por Maria e se comunicam com o corpo ou com os devotos, que são seus membros vivos: In Christo fuit plenitudo gratiae sicut in capite fluente; in Maria sicut in collo transfundente (43).

Maria pelos Santos Padres é chamada escada do céu, porque por meio de Maria Deus desceu do céu e por meio de Maria os homens sobem ao céu (44). E quando a Igreja diz que esta Rainha incomparável á a porta do céu e a janela do paraíso (45), nos ensina com estas palavras que todos os eleitos, justos ou pecadores, entram na mansão da glória por seu intermédio; com esta única diferença, que os justos entram por ela como pela porta diretamente, mas os pecadores pela janela (46), que é Maria; pela escada, que é Maria (47). 

Portanto, amigo meu, em Maria, depois de Jesus, devemos colocar toda nossa confiança e esperança da nossa eterna salvação. Haec peccatorum scala, haec mea maxima fiducia est, haec tota ratio spei meae (48). Unica peccatorum advocata, portus tutissimus, naufragantium omnium salus (49). Peccatorem quantumlibet foetidum non horret... donec horrendo Judici miserum reconciliet (50).

Oh! Feliz é aquele que invoca Maria com confiança, pois alcançará o perdão dos seus pecados, por muitos e por graves que sejam; alcançará a graça e, finalmente, a glória do céu, que tanto desejo a você e a todos.




Notas:


Santo Antônio Maria Clare
(*) O título completo é: Carta a um devoto do puríssimo e imaculado Coração de Maria. O original autografado se encontra em Mss. Claret, VIII, 521535. Deste original se fizeram as seguintes edições: Carta inédita do Beato Claret sobre o Coração de Maria: Boletim Secretariado Claretiano, janeiro-março 1940, n. 6769 pp. 24; Carta inédita do Beato Pe. Claret sobre o Coração de Maria: Iris de Paz 56 (1942) 11571158 4950 (assim a numeração do tomo); Carta a um devoto do imaculado Coração de Maria: Boletim interno da Prov. da Catalunha CMF, número extra, 6769, julhosetembro 1949, pp. 4752; Carta a um devoto do puríssimo e imaculado Coração de Maria em Santo Antônio Maria Claret, Escritos autobiográficos e espirituais (BAC, Madrid 1959) pp. 766772; Lozano, J. M.,O Coração de Maria em Santo Antônio Maria Claret (Ed. Coculsa, Madrid 1963) pp. 223239; Gil, J. M., Epistolário de Santo Antônio Maria Claret (Ed. Coculsa, Madrid 1970) vol. 2 pp. 14971506 (edição crítica); No centenário de Santo Antônio Maria Claret, apóstolo da devoção ao imaculado Coração de Maria; texto íntegro de uma carta de Santo Antônio Maria Claret sobre o amor que devemos a Maria Santíssima: Cruzado Espanhol 13 (1970) 167168.
* 1 Não sabemos quem fez esta petição ao Santo. Talvez uma das muitas pessoas dirigidas por Claret ou talvez um dos seus missionários. O certo é que o Santo aproveita a petição para escrever um breve tratado sobre a devoção ao Coração de Maria. “Você não podia pedir coisa melhor”, diz a seu destinatário. Aqui se vê uma vez mais, a in tensa devoção mariana do Padre Claret, que o acompanhou por toda a vida, desde a infância (cf Aut. n. 4355) até sua morte (cf Obsequio 1870 Claret, Escritos autobiográficos [BAC Madrid 1981] pp. 587588). Sobre sua devoção cordimariana cf Viñas, J. M., A devoção ao Coração de Maria segundo os ensinamentos do Beato Padre Claret: Bol. Prov. Catalunha CMF 11 (1949) 201225; Tisnés, R. M., Santo Antônio Maria Claret e Coração de Maria: Bol. Prov. Colômbia CMF 9 (1952) 4461.191203.255268; Ramos, C., Um apóstolo de Maria (Barcelona 1954) 368 págs.; Lozano, J. M., O Coração de Maria em Santo Antônio Maria Claret (Madrid 1963) 286 págs.; Leghisa, A., O Coração de Maria e a Congregação no momento atual (Roma 1978) 62 págs.
*2 Cf. Ducos, J.Ch., Le pasteur apostolique (Paris 1861) t. 1 p. 438. Claret toma a estrutura da carta deste autor e o segue de perto na redação de alguns parágrafos.
*3 Cf. Santo Tomás,Summa theol. 22 q. 23 a. 1c.
*4 No original autografado, o Pe. Claret cancelou a frase seguinte: «A fim de que nós a amemos e a ela acudamos sempre» (Mss. Claret, VIII, 522). Este parágrafo, que fala das relações da Virgem com a Santíssima Trindade, tomou também de Ducos (o. c., p. 438). Já em outras ocasiões o Santo tinha indicado esta mesma doutrina (cf.Carta pastoral sobre a Imaculada [Santiago de Cuba 1855] pp. 3, 5 y 37; O colegial instruído [LR, Barcelona 1861] t. 2 p. 501).
*5 No original autografado “partar”.
*6 Cf Santo Tomás, Summa theol. 3 q. 27 a. 4c. Na segunda edição do opúsculo claretiano Tardes de verão na real Chácara de Santo Ildefonso chamado A Granja (LR, Barcelona 1865, p. 121) se lêem estas palavras: «É regra geral que, quando Deus escolhe uma criatura racional para uma dignidade singular ou para um estado sublime, lhe dá todos os carismas de graça que à dignidade ou estado de dita pessoa são necessários e convenientes a seu esplendor» (São Bernardino de Sena, Sermo 10 a. 2 c. 1: Opera [Venetiis 1591] t. 3 p. 118 col. 2). Citado por Santo Alfonso Maria de Ligorio, As glórias de Maria (Barcelona 1870) pp. 197198.
*7 Claret vê a filiação mariana, sobretudo, através do Coração de Maria, que encerra dois aspectos principais: um amoroso e outro militante. Maria é a Mãe do Amor Formoso (cf. Aut. n. 447; Religiosas em suas casas [Barcelona 1850] p. 147): “Mãe do Amor Formoso..., concedei a todos os justos este divino amor; vo-lo rogo pelo amor que Deus vos tem” (ib., p. 155). O Coração de Maria é “frágua e instrumento do amor” (Aut. n. 447) e representa toda a vida interior da Virgem Maria, sendo habitação e paraíso de Deus (cf. Religiosas em suas casas, ed. cit. p. 105), centro de suas recordações e meditações (cf. A colegial instruída [Madrid 1864] pp. 423424) e cópia exata do Coração de Jesus (Mss. Claret, VIII, 501: “O Coração de Maria é a cópia mais exata do Coração de Jesus”. Mas o Coração de Maria é, ainda, manancial de força apostólica. Assim o viu na Arquiconfraria do Coração de Maria por ter lido e por experiência própria. “Ontem, escreve a D. Caixal, no dia 2 de agosto de 1847, fundamos a Arquiconfraria do Coração de Maria. Agora vamos continuar a novena. Já fiz e dá fruto. Muita gente assistiu a função. São muitas as paróquias que a pedem” (EC, I, pp. 234). E poucos dias depois, no dia 12 de agosto, lhe diz: “Quisera que se fizesse correr pela terra e por toda a Espanha a novena ao Coração de Maria” (EC, I, p. 236). O mesmo adjetivo imaculado, com que designa sempre o Coração de Maria, indica o aspecto apostólico e militante desta devoção, como sucede ao falar da Imaculada. Tanto o aspecto amoroso como o militante os tem presentes, sobretudo, quando comenta o nome de Filhos do Imaculado Coração de Maria dado a seus missionários (cf. Aut. n. 492494; Viñas, J. M., art. cit., pp. 201225).
*8 Cf. Ducos, J.Ch., o. c., pp. 438439.
*9 Cf. Santo Tomás, Summa theol. 3 q. 27 a. 5.
*10 Cf. Claret, Tardes de verão, ed. cit., p. 173.
*11 Cf. Sal 20, 4.
*12 Cf. Gallifet, J. De l’excellence de la dévotion au Coeur adorable de JésusChrist (Paris 1861) t. 1 p. 46ss; Mss. Claret, VIII, 502.
*13 Cf. Gallifet, J., o. c. pp. 264ss.
*14 Cf. Castiglione, L., Il Cuore di Maria aperto a tutti (Napoli 1850) p. 4, Mss. Claret, VIII, 502.
*15 «Se veneramos as relíquias dos santos, quanto mais o Coração de Maria! Que relíquia tão insigne!» (Mss. Claret, VIII, 503). Este mesmo argumento utilizavam São João Eudes e o P. Gallifet (o. c., p. 75).
*16 Devido ao influxo de Gallifet, o coração como órgão material ocupa aqui o primeiro plano, no entanto, Claret insiste quase sempre no coração espiritual e no que ele significa e representa.
*17 No original autografado, o Santo cancelou a palavra “puríssimo” e escreveu encima “imaculado”.
*18 Os escritores espirituais indicaram com freqüência as relações existentes entre o Coração de Maria e a encarnação do Verbo. M. Agreda fala das três gotas de sangue do Coração de Maria com as que as três pessoas da Trindade formaram o corpo do Senhor (cf. Mística cidade de Deus, LR [Barcelona 1860] t. 3 p. 239). A isto alude São João de Ávila em um sermão sobre a Assunção (cf. Obras completas, BAC [Madrid 1970] t. 3 p. 168). Caetano havia combatido esta teoria, chamando-a «erro novo nascido em nossos dias». O Padre Claret tinha feito alusão a esta opinião no Catecismo explicado (Barcelona 1849, p. 69). Em 1864, ao ser submetido o Catecismo único à censura de Roma, o censor pediu que se tirasse a menção das três gotas de sangue, fundando-se no comentário de Caetano a Santo Tomás (q. 31 a. 6). O Santo suprimiu o lugar citado pelo censor e achou dois argumentos que o convenceram: o ser contrário à Sagrada Escritura e à maternidade divina de Maria, marcando à margem ditas passagens (cf. Summa theologica cum Commentariis Thomae de Vio Cardinalis Caietani [Roma 1773] t. 7 p. 401. Ex libris). Desde então nas edições do Catecismo se suprimiu esta menção e o Santo corrigiu o texto desta carta, acrescentando as palavras “saída” e “nas entranhas de Maria”. Isto nos permite datara a Carta a um devoto do puríssimo e imaculado Coração de Maria, que foi redigida não muito antes de abril de 1864, data em que recebeu a censura romana do Catecismo (cf. Fernández, C., O Beato Antônio Maria Claret [Madrid 1946] t. 2 p. 547).
*19 Cf. Gallifet, J., o. c., p. 264ss.
*20 Cf. Claret, Tardes de verão, ed. cit., p. 123; Santo Tomás, Summa theol. 3 q. 35 a. 4c.
*21 Cf. Santo Tomás de Vilanova, Sermão 3 para a Natividade dede Nossa Senhora: Obras, BAC (Madrid 1952) p. 203. Afirmações parecidas se encontram em São Bernardino, São Boaventura e Suarez (cf. Santo Alfonso Maria de Ligorio, As glórias de Maria [Barcelona 1870] pp. 332334).
*22 No original autografado, cancela, “que exclamou Santa Isabel”.
*23 Lc 1, 42. Claret toma este parágrafo quase literalmente de Ducos, J.Ch., o. c., p. 440.
*24 Cf.Summa Theol. 3 q. 27 a. 5 ad 2. O exemplo de Santo Tomás se refere à preparação da Virgem Maria para a maternidade divina.
*25 Cf. Santo Tomás, ib.
*26 Cf. Atos 10, 38.
*27 Cf. Lc 2, 19: Maria... conservava todas estas coisas dentro de si, meditando-as em seu coração. Texto marcado com um traço marginal no exemplar do Novo Testamento de Torres Amat.
*28 Cf. Sal 39, 4. Frase freqüentemente citada por Claret ao falar da oração.
*29 O manuscrito autografado cita o Speculum c. 1. Se refere ao Speculum Beatae Mariae Virginis, atribuído hoje a Conrado de Saxônia (cf. Bibliotheca Franciscana Medii Aevi [Quaracchi 1904] t. 2 introd. p. 9.127).
*30 A doutrina sobre estas prerrogativas de Maria, de 2 a 7, as toma de Ducos, J.CH., o. c., pp. 441442.
*31 Cf. Speculum Beatae Mariae Virginis c. 6 p. 83. realmente, a frase citada por Conrado de Saxônia é de São Bernardo (Sermo 2 de Annuntiatione n. 2: PL 183, 391: Obras completas, BAC [Madrid 1953] t. l, p. 666).
*32 Cf. Mt 5, 17.
*33 Lc 2, 51: E lhes estava sujeito. Texto marcado no Novo Testamento de Torres Amat.
*34 Cf. Homil. 1 super “Missus est” n. 7ss: PL 183, 59ss: Obras completas, BAC, ed. cit., t. 1 p. 190.
*35 Hesíquio de Jerusalém, Homil. 2 de Beata Virgine:PG 93, 1461. Claret cita esta frase em seu livro Tardes de verão (ed. cit., p. 133). Leu em Ducos, J.Ch., o. c., p. 442, n. 2. O sentido da frase não é o que tradicionalmente lhe deram os autores espirituais. A palavra complementum, que responde à palavra grega pléroma, não significa no contexto de Hesíquio complemento, mas morada, habitação.
*36 Cf. Jo 1, 3.
*37 Cf. Ducos, J Ch., o. c., p. 444.
*38 Cf. São Bernardo, Sermo 1 de Assumptione n. 1: Obras completas, BAC, ed. cit., t. 1 p. 703.
*39 Cf. Speculum Beatae Mariae Virginis, c. 6.
*40 Claret cancelou “graças” e escreveu encima “misericórdias”. Estas frases as toma também de Ducos, J.Ch., o. c., p. 42.
*41 Cf. ib., p. 443.
*42 “pescoço” apagado. Depois escreveu “como o pescoço”.
*43 O manuscrito autografado, copiando Ducos, cita São Jerônimo. Refere ao texto tradicional da Carta a Paula e Eustóquio sobre a Assunção (PL 30, 16ss), que hoje se atribui a Pascásio Radberto. Realmente, este autor não chama a Virgem Maria pescoço do Corpo místico. O primeiro que o disse foi Ubertino de Casale comentando as palavras do PseudoJerônimo (cf. Arbor vitae crucifixae); cf. São Pedro Damião, Sermo 46: PL 144,753; Santo Agustinho, Sermo 123 n. 2: PL 39,1991; De praedestinatione sanctorum 15 31: PL 44,982983; São Fulgêncio, Sermo 36: PL 65, 899. Também se acha esta idéia em Germano de Tournai, que afirma: «Collum inter caput et corpus medium est, caputque iungit corpori. Collum ergo sanctae Ecclesiae competenter Domina nostra intelligitur quae, inter Deum et homines Mediatrix existens, dum Dei Verbum incarnatum genuit, quasi caput corpori, Christum Ecclesiae, divinitatemque humanitati nostrae coniunxit» (Tractatus de Incarnatione Christi 8: PL 180, 30). Aparece também com nitidez em São Bernardino de Sena, que diz: «Sicut per collum spiritus vitales a capite diffunduntur per corpus: sic per virginem a capite Christo vitales gratiae in eius mysticum corpus, et specialius in amicos atque devotos, continue transfunduntur» (Sermo 5 de Nativ. B. M. V. c. 8).
*44 Cf. o hino Ave, maris stella... felix caeli porta; São Bernardo, In vigilia Nativit. Domini. sermo 3 n. 10 (PL 183, 100): «Nada quis Deus que não passasse pelas mãos de Maria» (Obras completas, BAC, ed. cit., t. 1 p. 247).
*45 São Pedro Damião, Sermo 46: PL 144, 753: «fenestra caeli, ianua paradisi..., scala caelestis», São Bernardo, In Nat. B. M. V. sermo de aquaeductu n. 7 (PL 183, 441): «scala peccatorum» (Obras completas, BAC, ed. cit., t. 1 p. 741).
*46 No original autografado escreveu: “escalando pela penitência”, frase que depois apagou.
*47 Cf. Ducos, J.Ch., o. c., p. 443. Recordemos que o Pe. Claret tinha escrito um opúsculo intitulado A escada de Jacó e porta do céu, ou, súplicas a Maria Santíssima (Barcelona 1846) 32 págs.
*48 São Bernardo, Sermo de nativitate de aquaeductu n. 7: Obras completas, BAC, ed. cit., t. 1 p. 741: «Esta é a escada dos pecadores, esta é minha maior confiança, esta é toda a ração da minha esperança».
*49 Santo Efrém, Sermo de laudibus Beatae Virginis: «Ela é a única advogada dos pecadores, porto muito seguro e salvação de todos os náufragos».
*50 «Não se horroriza com o pecador, embora esteja fedendo..., contanto que possa reconciliá-lo com o tremendo juiz» (São Bernardo,In deprecat. ad B. Virg.). Citado por Ducos, J.Ch., o. c., t. 1 p. 443 nt. 3).
NOTA: Este opúsculo claretiano foi publicado no volume: Santo Antônio Maria Claret, Escritos Espirituais (BAC, Madrid 1985) pp. 496506; e em: Santo Antônio Maria Claret, Escritos Marianos (Publicaciones Claretianas, Madrid 1989) pp. 382292.


O Coração nas Sagradas Escrituras

 O Coração nas Sagradas Escrituras

Deus purifica o coração (Sl 25, 2); o coração confia no Senhor (Prov 3,5); o coração agradece (Sl 28, 7); o coração fala do Senhor (Sl 27, 8)... Jesus é manso e humilde de coração!
A palavra “coração” aparece em cerca de um milhar de passagens nas Sagradas Escrituras, nos informa um respeitado dicionário bíblico. E é fato. Contudo, como tudo que diz respeito à linguagem é preciso ter cuidado ao perscrutá-la, pois, as ressonâncias que esta palavra evoca no hebraico – ou nos contextos do Antigo e do Novo Testamento, melhor dizendo - não são as mesmas que em nossa língua.
Além de órgão humano ou animal, o coração é visto como sede do homem interior (1Pd 3,4), conhecido por Deus (1Sm 16,7). É a sede da vida intelectiva, dos pensamentos (Dn 2,30), da fé e da dúvida (Mc 11,23; Rm 10,8s), enfim dos sentimentos e das paixões em geral (Dt 15,10; 20,3; 28,47; Rm 1,24). O coração é ainda a sede da vontade, da vida moral e religiosa (Lc 21,14; 2Cor 9,7; Gl 4,6). Por isso o coração representa o homem todo (Jl 2,13).

“Coração” (no hebraico lêb, e sua variante lêbâb), muitas vezes é usado em um sentido que não tem nas línguas europeias. Confunde-se algumas vezes perfeitamente com a alma vegetativa, nephesh, e outras vezes com o espírito, rûah. Comumente se refere à alma, em geral, ou com suas funções fisiológicas, suas faculdades espirituais, ou, finalmente, com a vida moral. Por analogia, a Sagrada Escritura fala, também, do coração de Deus. Vejamos algumas passagens e sentidos:

I - O Coração, princípio da vida corporal — O coração é um órgão essencial à vida; nós procuramos ferí-lo quando queremos matar certemente a alguém (2 Sm 18,14;  2 Rs 9,24). Se o coração está em boas condições é saudável para todo o corpo (Pr 14,30). Como rege as funções vegetativas, é dito que ele está satisfeito e reforçado quando o homem se alimenta (Gen 18,5; At 14, 17). O cheiro do perfume o deixa feliz (Pr 27,9); mas é especialmente o vinho que lhe causa sensações agradáveis (Sl 104, 15; Eclo 40,20; Zc 10,7);  às vezes, seu abuso é condenado (Os 4,11; Eclo 31, 25-31).

II - O Coração, centro das faculdades espirituais: Enquanto que em nossa língua o coração é sede dos sentimentos e do amor, nas Sagradas Escrituras o coração é:
1.       A sede do pensamento, da reflexão e da meditação: É o coração que pensa (Eclo 17,6); que conhece (Jr 24,7); que medita (Sl 19,15); que reflete (Jr 12,11); que fala consigo mesmo (Gen 17,17; Sl 4,4). Os pensamentos surgem no coração (1 Cor 2, 9;  Lc 24,38) ou saem do coração (Jr 3, 16). Para aplicar o espírito em alguma coisa nós a colocamos no coração (1 Reis 8,18; Lc 21,14); nós aplicamos no coração (Jr 30,24; Dn 10,12). Como a verdade é a luz da inteligência, as metáforas extraídas da visão física são aplicadas ao coração. O coração recebe luz da verdade divina (2 Pd 1,19), ele tem os olhos que ilumina a verdade (Ef 1,18). Mas ele pode ser deformado (2 Cor 3,15), ou mesmo totalmente cego, isto é, ignorante e incrédulo  (Is 6,10; Mc 3,5; Rm 1,21). O coração está aberto à lei quando ele a conhece (2 Mc 1,4;  Sl 118, 32). Parece uma terra em que a palavra de Deus é semeada (Mt 13,19), um tesouro que fornece os pensamentos e palavras à boca (Mt 12,34-35; Lc 6,45). É, também, o coração que crê (Rm 10,10). Um coração largo significa uma grande inteligência e a pequenez do coração caracteriza a tolice. O coração do tolo parece um vaso rachado que deixa tudo escapar (Eclo 21,17), à cinza que não é bom para nada (Sb 15,10). A palavra manifesta o pensamento, assim, no sábio, é o coração que fala, e no tolo, é a boca que pensa (Eclo 21,29).  O coração fica doente devido ao pecado original, concebe, naturalmente, maus pensamentos (Gn 6,5).

Em tudo é enganador o coração, e isto é incurável; quem poderá conhecê-lo? Eu sou o Senhor, que perscruto o coração e provo os sentimentos, que dou a cada qual conforme o seu proceder e conforme o fruto de suas obras (Jr 17,9-10).

2.      2° A sede da sabedoria, que é um dom de Deus à inteligência. É no coração dos homens que Deus coloca a sabedoria e a habilidade necessária para fabricar os objetos de culto no deserto (Ex 35,35). O dom da sabedoria é concedido ao coração de Salomão (1 Rs 3,12), e aos justos (Pr 2,10; 16,21).
3.   3° A sede da memória, que mantém aquilo que a inteligência aprendeu (Dt 4,9; 8,5; Pr 4,21; Is 51,7). As coisas são inscritas no coração como nas tabuletas (Pr 3,3). Para revelar um segredo nós abrimos o coração.
4.  4° A sede da vontade. O coração leva a agir, é o princípio da ação (Pr 16, 9; Eclo 2,20); nós executamos o que está no coração (1 Sm 14, 7). Querer é doar o coração à ação (Is 10,7). Possuir seu coração é ser o mestre de sua vontade (Pr 16,1). O sábio mantém seu coração na mão direita, o tolo na mão esquerda (Ecl 10,2), isto é, um tem uma vontade enérgica e o outro uma vontade débil. Agir de grande coração (2 Mc 1,3),  é implementar todo o poder da sua vontade, e elevar o coração (Lm 3,41), é dirigir a Deus uma prece. Como a vontade é livre, ele pode resistir às influências externas, e particularmente às ordens de Deus. Dizemos que o coração é duro, ou que endurece: esta expressão é corrente nas Sagradas Escrituras. A dureza do coração é comparada à dureza de uma pedra (Jó 41,16), e mesmo àquela do diamante (Zc 7,12). Quando o coração amolece, a vontade torna-se mais dócil, ou mesmo enfraquece (Jr 51,46). A mudança do coração de pedra ao coração de carne (Ez 36,26), marca a passagem da revolta à obediência.
5.  5° A sede das disposições da alma. — Estas disposições são boas ou más. Entre as boas intenções do coração, os autores sagrados elencam: a justiça (Dt 9,5); a simplicidade (1 R 9,4); a docilidade ( 1 R2 3,9); a humildade  (Sl 131,1). O coração é perfeito quando é fiel a Deus (1 Rs 11,4; 15,14). A expressão « ter um só coração » marca a união estreita que reina entre os membros de uma mesma sociedade (II Par., xxx, 12; Jr 32,39; At 4,32). O coração também tem suas falhas: ele é vão, i. e., sem fundamento (Sl 5,10); leviano (Eclo 19,4); presunçoso ( Pr 28,26); pesado, que dizer, preso às coisas terrenas (Sl 4,3); é como a gordura (Sl 119,70), i. e., estúpido e grosseiro. O coração dúbio é o coração hipócrita e inconstante (Eclo 1,36), aquele no qual não podemos confiar, e que leva a lugar nenhum porque anda em dois caminhos simultaneamente. Quando se inclina ou se volta o coração para alguém, nós ficamos do seu lado (Jz 9,3).
6.   6° A sede das paixôes e dos sentimentos. — Do coração se originam o orgulho (Ez 28,2; Lc 1,51); a inveja que engendra a discórdia (Jacob., iii, 14); a avareza (Ez 33,31; 2 Pd 2,14); o ódio (Lv 19,17), que rasga o coração (At 7,54),  e o amor (Sl 67,26; Ct4,9; Mt 6,21); o medo, que perturba e dissolve o coração (Lv 26,36; Jr 4,19), e a coragem que vai até a ousadia e que dá ao homem um « coração de leão » (2 Sm 17,10); a tristeza que abate (At 21,13); a dor que perturba o coração (Sl 108,22), que o mói (Sl 50,19; Jr 23,9), o consome  (Sl 38,4), o derrete e mata (1 Sm 25,37), e a alegria o faz reviver ( Ex 4,14; Is 65,14).

Assim, nas Sagradas Escrituras, o coração é como:

... o centro do homem inteiro, o princípio interno, ao mesmo tempo espiritual e vital, que faz a unidade concreta do homem ou de onde parte sua atividade dinâmica e sua determinação moral. Tudo o que os gregos, ou os helenistas, chamam “espírito”, “razão”, “consciência” [(νους), (λόγος), (συνείδησης)] está envolvido em καρδιά (coração) e todos os afetos do corpo e da alma partem do coração (lêb) para ser conhecido claramente. Todos os raios da vida da alma e do corpo convergem para lá, e novamente desenvolvem-se dali

III - O coração, centro da vida moral. — Se a inteligência e a vontate têm suas sedes, por assim dizer, seus princípios no coração, é o coração que é o responsável pela ação. Os Livros Sagrados consideram ainda o coração sob este ponto de vista.
1° O coração, sede dos desejos. — O coração deseja o que é bom e permitido (Sl 15,5), mas também, sob a influência da concupiscência natural, ele deseja o mal (Pr 6,25; Mt 5,28; 15,18).  O coração que se abandona aos desejos maus é chamado « incircunciso » (Jr 4,4; At 7,51).- A circuncisão do coração, isto é, a luta contra a concupiscência é um dever imposto ao cristão (Rm 2,29).
2° O coração, sede da consciência. — O coração tem conhecimento do mal que reside nele e ele retorna o culpado (1 Jo 3,20). Ele retorna ao seu coração, ou seja, retorna a si mesmo e toca o coração como um sinal de arrependimento (1 Sm 24,6). Ele deve ser renovado com a ajuda da graça divina (Ez 18,31), e torna-lo puro para agradar a Deus (Mt 5,8). A alegria da consciência é a consequência desta pureza (Eclo 30,16). No entanto, ninguém pode garantir que ele tenha a perfeita pureza (Pr 20,9).
3° Os deveres a cumprir « de todo seu coração ». — Esta expressão « de todo seu coração » é recorrente nas Sagradas Escrituras. Este modo de falar significa que devemos aplicar na realização destes atos todas as faculdades da alma incluídas na palavra "coração", portanto: inteligência, reflexão, vontade, paixão e consciência moral.
Ouve, ó Israel: Iahweh nosso Deus é o único Iaweh! Portanto, amarás a Iahweh teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com toda a tua força. (Dt 6,5)
Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento. (Mt 22, 37)

Por analogia, as Sagradas Escrituras atribuem ao próprio Deus um coração (Gn 6,6). Nosso Senhor se apresenta a nós como « humilde de coração » (Mt 11,29). Não há nenhuma razão para dar à palavra "coração" nesta passagem, um significado mais estreito do que no resto da Escritura. A humildade do coração de Jesus Cristo, portanto, refere-se tanto aos seus pensamentos, à sua vontade, às suas afeições, em uma palavra, a todos os atos de sua alma.

Talvez seja por tudo isto que Karl Rahner, ao enunciar algumas teses sobre o culto ao Sagrado Coração de Jesus, tenha dito que “coração” é uma “protopalavra” (Urworte), pertence ao patrimônio fundamental da linguagem humana e pretende dizer um mistério inefável. “Só o amante pode dizer com sentido a palavra “coração””, dizia ele, e “só quem está amorosamente unido ao Senhor crucificado, sabe o que quer dizer “Coração de Jesus””.

Há palavras que dividem e palavras que unem. Coração seria, portanto, uma palavra que une e nos faz sábios, que nos esclarece em lugar de nós a ela. Ela não nasceu da experiência do anatomista, senão da experiência do homem. Pertence ao tesouro primitivo da linguagem humana. Pertence às palavras que o homem enuncia, sabedor de si mesmo, o mistério de sua existência. Quando o homem diz que tem um coração, e compreende, realmente, o que significa tal palavra, diz a si mesmo um dos mistérios decisivos de sua existência, captando seu centro original enquanto unidade e totalidade.  E, assim sendo, tal palavra é, definitivamente, insubstituível, e mais, é realizável sempre que pronunciada.